Desafios da mediação imobiliária: a visão de quem anda no terreno O que esperar do setor em tempos de guerra, de inflação alta e de custos de construção elevados? Especialistas traçam o rumo. 15 jul 2022 min de leitura Índice de conteúdo O que esperar da mediação imobiliária até final do ano? Preços das casas vão continuar a subir? Comprar ou arrendar casa? Bolha imobiliária, sim ou não? Tecnologia a ganhar força no imobiliário? Primeiro foi a pandemia da Covid-19 e agora é a guerra na Ucrânia, que está a contribuir para fazer disparar a inflação – já está nos 8,7% em Portugal – e para acelerar a anunciada subida das taxas de juro. Pelo meio, aumentam também os custos de construção e, claro, o poder de compra dos portugueses é esmagado, à boleia da subida dos preços. Que impacto terão estes e outros fatores no setor imobiliário, nomeadamente na mediação imobiliária? E o que se pode esperar do futuro? Incerteza é palavra de ordem, mas resiliência também. Contamos tudo com a ajuda de profissionais do setor. ”Do lado” da promoção imobiliária, conforme escrevemos, a confiança mantém-se, apesar de haver (muitos) desafios. Depois de ter ouvido alguns especialistas no início do ano, antes de eclodir a guerra, o idealista/news aproveitou a edição 2022 do Salão Imobiliário de Portugal (SIL), que decorreu em maio, para voltar a fazer um raio-x ao setor da mediação imobiliária. Que impacto está a ter o novo contexto global no imobiliário? Os preços das casas vão continuar a subir? Vem aí uma bolha imobiliária? Comprar ou arrendar, qual é melhor opção tendo em conta a atual conjuntura? Resumimos, em baixo, o feedback dado pelos mediadores imobiliários a estas e outras perguntas. Gtres O que esperar da mediação imobiliária até final do ano? Resiliência, incerteza e um horizonte repleto de desafios. Os especialistas do setor mantêm-se confiantes e consideram que se vão continuar a comprar e vender muitas casas em Portugal. Mas, claro, é de esperar alguma turbulência, devido à instabilidade atual existente um pouco por todo o mundo. “A guerra traz-nos instabilidade, traz-nos alguma dificuldade nos abastecimentos de matérias-primas e o aumento generalizado dos preços (…). A guerra para a mediação traz sobretudo essa incerteza de que os mercados não gostam e, portanto, não me deixa particularmente confortável. Claro que espero sempre o melhor, mas deixa-nos alguma insegurança”, começa por dizer Alfredo Valente, CEO da iad Portugal. Mas resiliência tem sido imagem de marca do setor, comenta, deixando também alguns sinais de otimismo: “O setor da mediação imobiliária vive um excelente momento, um momento em que se reinventa também na saída da pandemia. O que podemos esperar é a continuação de uma certa dinâmica que conhecemos em 2021 do mercado. Acho que o mercado vai continuar dinâmico no ano de 2022 e acho que vai ser cada vez mais exigente. Sobre este ponto de vista, estamos perante um cliente cada vez mais exigente, cada vez mais informado, e isso exige dos atores da mediação imobiliária uma evolução também no sentido de ter cada vez maior informação”. Uma mensagem positiva também deixada, de resto, por Ricardo Sousa, CEO da Century 21 Portugal: “Começámos o ano de 2022 com excelentes perspetivas, melhores do que iniciámos 2021. E há vários fatores, nacionais e internacionais, que geram preocupações, nomeadamente estes fatores geopolíticos e as coisas que não controlamos, mas estamos a sentir que a confiança dos portugueses no mercado imobiliário residencial mantém-se forte. Há uma grande resiliência da procura, que está bastante ativa”. Segundo o mesmo responsável, “a mediação imobiliária tem uma prova de fogo neste momento”. “Há um gap muito grande entre a procura e a oferta, não só em quantidade, mas em características de preço, tipologias dos imóveis. E a mediação imobiliária tem hoje a oportunidade de marcar, de facto, uma diferença no mercado português, de ajudar e ser esse facilitador, esse criador de oportunidade, de encontrar e juntar as pessoas, acompanhar ao longo do tempo”, acrescenta Ricardo Sousa. Rui Torgal, CEO da ERA Portugal, diz que não perspetiva nem antecipa qualquer quebra no negócio e que fatores como a subida das taxas de juro farão com que a mediadora possa ter de se “ajustar”, mas não “desistir”. “Aquilo que espero é que o mercado venha este ano a comportar-se como tem-se comportado desde o início. Portanto, que os resultados sejam excecionais. Aquilo que posso garantir é que na nossa empresa os resultados vão ser excecionais, porque mesmo que o mercado não cresça a este ritmo, vamos continuar a trabalhar com o mesmo empenho, com o mesmo entusiasmo, com a mesma alegria para conseguir chegar aos melhores resultados”. Foto de Ketut Subiyanto Preços das casas vão continuar a subir? Os preços das casas em Portugal têm vindo a subir de forma constante. Os dados mais recentes do Eurostat, por exemplo, mostram que aumentaram cerca de 70% nos últimos 12 anos, entre 2010 e 2022, tendo havido pelo meio, entre outras “crises”, uma pandemia. E, agora, uma guerra. Será que o cenário se vai manter? “Ninguém sabe quanto tempo vai durar a guerra, mas enquanto houver guerra vai haver falta de materiais. Os materiais estão caríssimos, alguns multiplicaram por cinco e por dez. É normal que o [produto] novo continue a ser mais caro. E o [produto] usado mais ou menos acompanha, infelizmente, não é? E o novo cenário passa mesmo por ir para a construção mais barata, onde o terreno é mais barato, que é nas periferias [das cidades], porque as pessoas precisam de casas e têm de continuar a comprar casa”, explica Beatriz Rubio, CEO da Remax. “A minha perspetiva é que vamos continuar a vender muito, mas mais barato, porque os agregados familiares estão a ganhar menos dinheiro. O setor imobiliário vai continuar a vender, vai é vender casas mais baratas e, portanto, para fazermos os mesmos números que fazíamos noutros anos temos de vender mais”, acrescenta. Frederico Abecassis, CEO da Coldwell Banker, enaltece o facto de Portugal “ser um destino seguro em termos de investimento”. “Isso tem sido o principal mote, digamos, para a compra de habitação em Portugal. Os preços e o mercado vão continuar bastante dinâmicos. Estamos muito positivos relativamente a este ano. Possivelmente vai ser um ano tão bom como o do ano passado”. Também Luís Mário Nunes, CEO ComprarCasa, considera que o setor da mediação imobiliária respira confiança. “Acho que os preços do imobiliário vão continuar quentes. Se vamos continuar a ter crescimentos brutais de compra e venda? Acho que vai haver uma estabilização, o que também é necessário nos mercados, nomeadamente perante uma situação de indefinição como a que vivemos hoje”, afirma. “Mesmo assim acredito que continuaremos a ser dos mercados com maior rentabilidade e com maior confiança para investir”, sublinha. Gtres Comprar ou arrendar casa? É uma das perguntas da praxe: comprar ou arrendar casa, o que é melhor? E agora, tendo em conta o momento que se vive, o que poderá ser maios rentável e/ou atrativo para as famílias? “A resposta que gostava de dar é que a compra e o arrendamento andam de mãos dadas. Não podemos falar de compra sem falar no arrendamento, até porque muito daquilo que são os nossos clientes compradores são clientes investidores, são clientes que compram casa na expectativa de a colocarem também no mercado de arrendamento. Se me pergunta no meu ponto de vista, aquilo que poderemos falar em termos do que é um bom investimento, um investimento refúgio, claramente terei de dizer a compra”, refere Rui Torgal. “Como player do setor, acho que o mercado português precisava de ter um arrendamento dinâmico. E não temos”, lamenta Luís Mário Nunes, considerando “que ainda não há um dinamismo que faça com que olhe para o mercado de arrendamento como algo que possa contrapor a compra e venda”. “Continuo a achar que, na dúvida, compre”, sugere. “Comprar, neste momento, continua a ser a melhor opção. O investimento imobiliário é um investimento líquido, é um investimento que está sempre a ser rentabilizado. E se tivermos em consideração as baixas taxas de juro que ainda hoje estão a ser praticadas na obtenção do crédito bancário junto dos bancos, continua a ser a melhor opção comprar”, atesta Frederico Abecassis. Photo by Chris Ainsworth on Unsplash Bolha imobiliária, sim ou não? A subida dos preços das casas em tempos de guerra poderá fazer com que possa haver uma bolha imobiliária em Portugal? Há muito que se fala desta possibilidade, mas os especialistas ouvidos pelo idealista/news, apesar de se viverem tempos de incerteza, desdramatizam o tema. “Não acreditamos na existência de uma bolha imobiliária. O mercado está dinâmico. Todos os indicadores são favoráveis para que não exista essa situação no mercado português”, comenta o CEO da Coldwell Banker. “Defendo que não há esse risco. As decisões que o Banco Central Europeu tomou há cinco, seis anos fazem com que hoje não estejamos a viver aquilo que vivemos no passado quando tivemos uma bolha imobiliária. Realmente, os players financeiros estavam a financiar mais do que a compra, hoje isso não acontece. A maioria das pessoas tem os seus 15% a 20% para a proteção pessoal. Não acredito, sinceramente, que isso possa haver uma bolha imobiliária”, aponta Luís Mário Nunes. Photo by Priscilla Du Preez on Unsplash Tecnologia a ganhar força no imobiliário? A tecnologia e a digitalização chegaram em força ao mercado da mediação imobiliária, tendo a pandemia da Covid-19 servido de alavanca e ajudado a perceber isso mesmo. Foi, aliás, uma espécie de balão de oxigénio durante os vários períodos de confinamento. Mais recentemente, o fenómeno das criptomoedas veio também, de certa forma, trazer inovação ao setor. Irá o cenário manter-se ou ganhar ainda mais força nos próximos tempos? “A tecnologia é crucial, mas se o setor privado, se as empresas, são quase forçadas a adaptar-se, porque para muitas é uma questão de sobrevivência, acho que precisamos de um Estado mais amigo da tecnologia. Precisamos de um de serviço público mais amigo da tecnologia”, apela Alfredo Valente. Uma opinião partilhada, de resto, por Rui Torgal: “Claramente que a tecnologia veio para ficar, mas ao contrário daquilo que foi veiculado e que muita gente pensou com esta mudança de paradigma, a tecnologia não vem substituir as pessoas, vem facilitar o trabalho das pessoas”. “O cenário mudou totalmente. Nos últimos dois anos, foi como se nós tivéssemos evoluído dez a nível tecnológico. Neste momento, conseguimos realizar uma transação 100% de forma digital e isto irá manter-se, o que acaba por facilitar todo o processo de compra e venda de um imóvel”, conclui Frederico Abecassis. Partilhar artigo FacebookXPinterestWhatsAppCopiar link Link copiado