“Há muito capital a querer entrar em Portugal e pouca oportunidade” Segundo Francisco Sottomayor, CEO da Norfin, "a entrada do capital internacional tem sido muito boa para o mercado português". 28 jun 2022 min de leitura “Detesto dizer que somos um mercado pequeno, mas não somos um mercado muito grande e, de facto, há muito capital a querer entrar e pouca oportunidade, ou oportunidades a menos”. É desta forma que Francisco Sottomayor, CEO da Norfin, respondeu ao idealista/news quando questionado sobre se Portugal ainda é um destino atrativo e se continua e continuará no radar dos investidores imobiliários estrangeiros. O contexto atual é de incerteza, devido à inflação alta e à subida dos custos de construção, bem como das taxas de juro, num cenário que tem como pano de fundo uma inesperada guerra, mas confiança parece ser palavra de ordem. “Estamos razoavelmente confiantes de que o mercado vai continuar dinâmico”, disse-nos Francisco Sottomayor numa conversa realizada durante a edição deste ano do Salão Imobiliário de Portugal (SIL), que decorreu em maio. Entre os vários temas abordados estão, além dos mencionados em cima, o setor da promoção imobiliária em Portugal, bem como a tão falada dinamização do mercado de arrendamento. Também os projetos da Norfin foram passados a pente fino pelo CEO da Norfin, e há novidades na calha, como contamos neste artigo. Francisco Sottomayor, CEO da Norfin, junto ao stand da empresa no SIL / Crédito: Diogo Coelho Inflação alta, custos de construção e taxas de juro a subir... O que é que se pode esperar para o setor imobiliário tendo em conta o cenário atual? O que se pode esperar deste contexto é um ano de alguma dificuldade, de algum ajustamento. Vínhamos de um período longo de ajustamento, de muito crescimento e de algum ajustamento de expectativas decorrente da Covid-19. E neste momento temos um contexto diferente na Europa, não só pela situação da guerra que existe, como também pela perspetiva que existe sobre a inflação. "O mercado imobiliário sempre viveu bem e sempre beneficiou de um pouco de inflação. Se ela se descontrola pode ser mais complicado, nomeadamente se impactar no rendimento das famílias e das empresas. Não é isso que nós perspetivamos na análise que fazemos, mas temos de estar vigilantes relativamente a este tema" A inflação é um tema do qual se tem falado muito, mas sobre o qual ninguém tem certezas. É um tema de grande incerteza e que poderá ao longo do ano, dependendo da evolução, impactar o mercado de forma maior ou menor. Um pouco de inflação é bom para o nosso mercado. O mercado imobiliário sempre viveu bem e sempre beneficiou de um pouco de inflação. Se ela se descontrola pode ser mais complicado, nomeadamente se impactar no rendimento das famílias e das empresas. Não é isso que nós perspetivamos na análise que fazemos, mas temos de estar vigilantes relativamente a este tema. Há um primeiro impacto que já se está a sentir no mercado, que tem que ver com a inflação do custo de construção, que tem razões ainda decorrentes da pandemia e razões decorrentes da situação atual que a Europa vive. Mas é muito cedo para perceber se é um fenómeno que atingiu o pico e que está a estabilizar ou se é um fenómeno que ainda terá outros capítulos mais difíceis. Já há algum impacto, há alguns projetos que estão a ser repensados. Nós próprios estamos a fazer se calhar mais “value engineering” nos projetos do que faríamos se não fosse este o contexto. Mas estamos razoavelmente confiantes de que o mercado vai continuar dinâmico. Falou em projetos que estão a ser repensados. O que é que está a ser feito? No passado, na promoção imobiliária, o promotor pensava o produto, entregava o desenho a um gabinete arquitetura, a um gabinete projetista, e no final do processo ia buscar o construtor. Acho que hoje em dia, e cada vez mais, este processo tem de ser muito mais integrado. As equipas têm de trabalhar muito mais juntas, muito mais numa lógica de colaboração, e muitas vezes a forma como o projeto está pensado tem de ser alterada e o projeto repensado e trabalhado até se chegar a uma solução final que caiba nos “economics” de um projeto normal. Empreendimento Monview Miraflores, um dos projetos da Norfin / Norfin Resiliência tem sido palavra de ordem no setor imobiliário e da construção. Acredita que vai continuará a ser, tendo em conta o contexto atual? O mercado residencial continua a ter um desequilíbrio entre oferta e procura e aquilo que tem determinado a variação no preço é a falta de oferta em volume, em localização e em qualidade suficientes. Temos ainda, apesar de alguma evolução nos últimos dez anos, um parque imobiliário mal cuidado, desajustado, antigo, etc. E o facto é que muita da promoção imobiliária que tem existido não tem servido o grosso do mercado, que será necessariamente a classe média. Essa secção do mercado não tem resposta e dificilmente terá muito rapidamente. É um desígnio nacional compor esta equação, este equilíbrio de oferta e procura. Mas não se vai resolver rapidamente. Acho que o mercado tem condições para continuar numa trajetória de algum crescimento. Se calhar não tão acelerado como no passado, mas com uma trajetória de algum crescimento. Até porque nós sabemos que um registo de inflação traz ao pequeno aforrador mais vontade de investir em imobiliário. É uma classe de investimento em crescimento para os pequenos aforradores, o que faz aquecer um pouco o mercado. "Temos ainda, apesar de alguma evolução nos últimos dez anos, um parque imobiliário mal cuidado, desajustado, antigo, etc. E o facto é que muita da promoção imobiliária que tem existido não tem servido o grosso do mercado, que será necessariamente a classe média. Essa secção do mercado não tem resposta e dificilmente terá muito rapidamente" Fala-se muito na necessidade de aumentar a oferta de casas para a classe média e de habitação acessível. O que está a ser feito nesse sentido? A equação económica de construir para a classe média tem dificuldade em funcionar, regra geral. Também se confundem muitos conceitos. Construção a custos acessíveis não é habitação social. Rendas controladas é outra coisa diferente. Acho que metemos tudo no mesmo bolo. Para resolver o problema como um todo é preciso que como um todo os atores se entendam. E os atores são as câmaras, é o Governo central em larga medida e são naturalmente os promotores, no sentido de quem tem capacidade para entregar e de quem tem o capital para resolver o problema, porque este problema não se resolve sem capital. E o capital não é o do Estado que vai resolver este tema. Tem de haver uma conjugação de esforços e estas coisas demoram tempo. Não vejo, para ser sincero, grande concertação entre os atores deste cenário, mas acho que ele já foi pior e que se estão a tentar encontrar soluções. As câmaras têm um papel muito importante, têm terreno, que é uma das componentes da equação, e acho que têm de se encontrar modelos que permitam que economicamente isto faça sentido. Até agora ainda não se conseguiu. A dinamização do mercado de arrendamento também é uma das componentes da equação, através da aposta no coliving, por exemplo? Fala-se muito dos novos produtos do arrendamento. O grosso do mercado não vai ser isso. Vai continuar a ser o mercado de arrendamento tradicional, e sabemos que quando a inflação aparece e quando os investidores começam a ter mais dificuldade em acreditar no produto financeiro como um produto de refúgio para a sua poupança investem em imobiliário e colocam a arrendar. O arrendamento vai ganhar alguma dinâmica por essa via. Já tem vindo a ganhar e acredito que vai crescer. Mas acredito também que estruturalmente Portugal vai continuar a ser um país de proprietários, se calhar reequilibrar-se um pouco. É um mercado que pode evoluir, pode profissionalizar-se. Cada vez mais quem arrenda quer serviço, não quer só a qualidade e a localização do apartamento. Podemos evoluir aí. Essa é uma área onde há muito para aprender e para crescer. "(...) Quando a inflação aparece e quando os investidores começam a ter mais dificuldade em acreditar no produto financeiro como um produto de refúgio para a sua poupança investem em imobiliário e colocam a arrendar" As taxas de juro estão a subir. Que impacto terá este cenário, a par da inflação, na concessão de crédito habitação? Os bancos têm sofrido um pouco com as taxas de juro muito baixas e julgo que, de uma forma mais ou menos envergonhada, vêm o crescimento das taxas de juro como uma coisa que os pode ajudar a equilibrar a sua própria rentabilidade. Não antevejo que no curto/médio prazo haja uma alteração radical na forma como os bancos olham para o financiamento em Portugal. Se não houver uma quebra relevante no poder de compra, a equação do mercado residencial vai manter-se razoavelmente estável. Os bancos estão bem capitalizados e continuam a competir muito uns com os outros pelos clientes e pelas hipotecas. Acredito que este mercado se vai manter. Photo by Martin Förster on Unsplash Portugal tem condições para continuar a captar investimento estrangeiro? O investimento estrangeiro que entrou em Portugal tem encontrado um ambiente confortável de investimento. Regra geral, as rentabilidades têm saído em linha com as expectativas. Esse investimento tem condições para continuar. Aliás, vemos todos os dias na Norfin traços desse continuado interesse. Aquilo que há e que existirá sempre, que é endémico, é um desfasamento entre o volume que quer entrar e a capacidade de produto que existe disponível no mercado. Detesto dizer que somos um mercado pequeno, mas não somos um mercado muito grande e, de facto, há muito capital a querer entrar e pouca oportunidade, ou oportunidades a menos das que podiam existir. "Aquilo que há e que existirá sempre, que é endémico, é um desfasamento entre o volume que quer entrar e a capacidade de produto que existe disponível no mercado. Detesto dizer que somos um mercado pequeno, mas não somos um mercado muito grande e, de facto, há muito capital a querer entrar e pouca oportunidade" A entrada do capital internacional tem sido muito boa para o mercado português. Tem obrigado a uma maior profissionalização, tem trazido outros standards de qualidade. Tem-nos obrigado, no caso da Norfin, a ir muito além daquilo que seria a nossa performance normal. Tem-nos obrigado a repensar muito mais o produto e os processos internos. Isso é muito bom. Tem sido uma experiência muito boa na Norfin. Partilhar artigo FacebookXPinterestWhatsAppCopiar link Link copiado